quarta-feira, novembro 16, 2005

Let the sun shine!

Isto das teatrices é sempre muito engraçado, principalmente quando está na moda. Começa a ser moda fazer de conta e então...
Não pode ser criticado, principalmente tendo em conta a forma como estão as coisas à nossa volta.

Noventa por cento das pessoas não gosta do que faz, nem do que vê ao espelho e então, arranjam tudo para ter pequenos momentos de felicidade. Já que não conseguimos ser sempre felizes, vamos sendo, vestindo a pele deste e daquele a ver se assim já conseguimos sair à rua de cabeça erguida. Pensamos todos nós inconscientemente cada vez que saímos para a arena.

O povo português gosta e, vamos acabar duma vez por todas com este preconceito de arte de elites. O teatro é a sociedade em que vivemos, as personagens são a Aidinha que vai ao pão quente comer uma tijelinha de creme e ao fim da tarde apanha na cara do Manel que chegou a casa aborrecido porque tinha batido com o táxi. É muito simples, basta olhar à nossa volta e em cada rosto reconhecemos o protagonista. A diferença é que não recebem aplausos...a diferença é que ninguém repara que aquela cena já está muito repetitiva...a diferença é que ninguém repara, ponto.

Mas depois há quem repare e, vejam lá meus senhores, quem estude este fenómeno! Até há quem lhe dedique a vida toda e mesmo assim não chega. Como é o caso de Sílvia Correia, actriz e workshop leader, que em conversa com a nossa equipa de reportagem, foi mostrando o que lhe vai na alma. «O teatro é muito importante do meu ponto de vista para o desenvolvimento pessoal e social das crianças e adolescentes. Ensina a despertar para a vida, a ter uma consciência e perspectiva da história mais alargada; a ter uma maior consciência do espaço que nos rodeia e das relações afectivas. Desperta os sentidos, trabalha as emoções, aprendemos a saber estar e falar para o grande público sem receios, entre tantas outras coisas. Esta é a base para uma boa formação pessoal. Sabermos conhecer-nos para depois conhecer os outros. Por mim todos os adolescentes teriam formação de expressão dramática», vai acrescentando a actriz.

Mas também há quem não acredite, porque isto de vestir e despir e pentear e pôr e tirar e mexer no que está quieto, dá algum trabalho e acima de tudo custa dinheiro e aí, aí é que a porca torce o rabo! Onde meta dinheiro, ou a desgraçada da porca vai sofrer muito ou acaba em entremeada, que todos gostam e não é de elites. Segundo a nossa professora, «não podemos estar à espera de apoios para fazer teatro, nem aqui nem em qualquer parte no mundo. Todos sabemos que os apoios estatais apenas são para aqueles que já têm nome na praça e muita experiência nas áreas artísticas, por conseguinte, não adianta lamentarmo-nos constantemente por uma coisa que só muda quando mudar todo este governo que se tem revezando desde o 25 de Abril de 74». No entanto, Sílvia acrescenta em tom de desabafo, «para qualquer artista fazer teatro, ou qualquer outra forma de expressão de arte, é a necessidade e a vontade que parte de nós mesmos e não o dinheiro que o estado ou as autarquias deviam dar e não dão. Há que trabalhar muito. O teatro não tem sido devidamente apoiado nem impulsionado na cidade do Porto, mas cabe-nos a nós fazer por isso».

A corda rebenta e sempre do mesmo lado, como nós sabemos. Que o venha a contradizer o Sr. vereador da cultura da câmara municipal do Porto que me deixou sem resposta quando foi abordado em relação a este imbróglio: Cortar fatalmente com as verbas para o ensino de teatro em escolas secundárias, deixando assim hipoteticamente, de se apostar na cultura da futura geração deste país. País, que aquando de cada recessão económica, já nos foi habituando que, a primeira coisa que se corta é a cultura... Vá! Digam que realizamos bons eventos culturais para além do futebol, porque dizem muito bem! Mas quem os pode ver?

As voltas que o nosso querido Gil Vicente já não terá dado ao caixão. Sim ele, que recebia do próprio rei em pleno século XV para satisfazer os prazeres da corte e agora, o nosso rei vai literalmente nu, a ver se ele próprio ainda consegue satisfazer os nossos prazeres.

Credo! É um luxo! Depois estamos a pôr uma arma perigosíssima na mão deles! Exclamaram, certamente, eles em cada reunião para a aprovação do orçamento para a cultura. É verdade...o teatro dá vida a textos, mesmo aqueles que são difíceis de ler por alguns... se calhar até esses iam reflectir sobre as coisas! O teatro faz renascer mitos com a mesma facilidade que os desmistifica. O teatro comunica com todos e chega a todos, coisa que a maioria dos mortais não consegue.
Vamos a ver até é coisa do Demo!

...Para quê ofuscar aquilo que nos assusta, se depois do nevoeiro o sol brilha sempre mais forte?

12.04